sexta-feira, 11 de julho de 2014

O Livro das Tentações
— exercício saramorgasmiano —

Sobre o braço esquerdo ele, sobre o direito ela, no leito deitados estão, braços inúteis que sois, pelo pouco que participais nas gesticulações que já se adivinham, enquanto estes que aqui estão não saírem do porto da hesitação, que é o mesmo que dizer, vou não vou, para a frente é que é o caminho, isso bem o sabemos, mas que caminho é esse, que o teu seja o meu, vem, vem, que entre mim e ti nada haja que não seja a humidade das nossas peles, a música dos nossos corpos juntos na mesma vontade, feita de tantos desejos adiados, de tão fugidias certezas, que agora mais parece que ali não se acredita naquilo que os olhos dizem e as mãos vão fazendo. Um lábio freme, dois que escorregam, já no colo vão, onda que se acrescenta, torrente que em todas as portas bate, abre uma, não é por aqui, enche e cresce, empurra outra porta, abre-a, precipita-se em fluxos e refluxos, não há mar que a receba, só um abismo a salvará. É entrando que em espraiada espuma desliza.

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